1930-1939 | Enciclopédia Prática da Construção Civil

Título curto

1930-1939 | Enciclopédia Prática da Construção Civil

Título completo

Enciclopédia Prática da Construção Civil. Arcos e Abóbadas. Caderno 15

Autor

Francisco Pereira da Costa

Data 1ª edição

1930-1939

Citação 1

«ABÓBADAS

*A*s abóbadas são construções de ordem curvilínea, de cantaria, de alvenaria de pedra e de tijolo, e tem como destino a cobertura de edifícios ou as suas dependências e outras obras de fins especiais, como reservatórios, túneis, etc.
As suas formas podem ser as mais variadas, dependendo apenas do local onde se construam e da obediência ao projecto da obra, que lhes darão o aspecto mais conveniente.
 As abóbadas podem ser "rectas" ou "planas", "cilíndricas", "de berço", "de arestas", "de barrete de clérigo", "de lunetas" e "de cúpula", quanta a forma dos seus arcos, e "direitas", "enviesadas", "curvas" ou "inclinadas", quanto a sua directriz.
Estas construções podem cobrir espaços quadrados, rectangulares, paralelogrâmicos e quaisquer outros em que os seus nascimentos possam assentar.
Os traçados das abóbadas obedecem aos mesmos princípios dos tratados dos arcos.
Algumas abóbadas são de grande efeito construtivo e, sob o ponto de vista ornamental, apresentam por vezes uma imponência, apreciável Quando são construídas em cantaria, o aparelho das pedras obedece às convergências da estereotomia. As abóbadas construídas de tijolo rebatido são rebocadas no intradorso, que serve de tecto para as dependências que cobre.
Nas obras de alvenaria de pedra com argamassa de cimento e areia, também se aplica o reboco, pois este trabalho deve ficar acabado como ficam todas as outras alvenarias, e o intradorso de uma abóbada e, acentuamos, um tecto como qualquer outro. As abóbadas de cantaria são sempre aparelhadas no intradorso e, algumas vezes, também o são no próprio extradorso.
De uma maneira geral, a maioria das abóbadas não fica com o extradorso à vista, antes costuma ficar nivelado com alvenaria ou betão, afim de receber um pavimento ou qualquer outra obra que lhas fique superior.
A construção das abóbadas com tijolo e alvenaria de pedra, e em tudo análoga a construção dos arcos dos mesmos materiais. A construção de cantaria difere um pouco : enquanto nos arcos, se são estreitos, uma só pedra compõe toda a espessura, se não largos, em geral, todo o intradorso é decorado, composto por conseguinte com varia!! pedras na largura, concordantes com a espessura; nada disso, porem, sucede nas abóbadas.
As pedras são dispostas e assentes com as suas juntas ou espessos desencontrados, e ligando-se homogeneamente com as pedras dos pés direitos.
A classificação das abóbadas é curiosa e vem, como se sabe, dos mais remotos tempos. Vamos explicá-la:

"Abóbada de berço" - Esta abóbada também designada "cilíndrica", é de todas a mais simples, pois é constituída por arcos de volta perfeita. A sua construção pode ser enviesada e montante, como acontece com os arcos.

"Abóbada abatida" - A abóbada abatida ou "de asa de cesto" só difere da "de berço", por ser constituída por arcos abatidos ou de asa de cesto. Também se constrói com "arcos de gearção".

"Abóbada Esférica ou de cúpula" - Esta curiosa abóbada nasce apoiada numa construção contínua ou circular, denominada tambor e não necessita de simples. Vai-se eregindo por fiadas até se fechar completamente. Basta apenas um bom andaime para os pedreiros poderem trabalhar à vontade. Para maior estabilidade da construção e conveniente, quando se aproximar o seu fim, assentar provisoriamente no seu lugar, os fechos ou chaves da abóbada, até se fechar totalmente a sua coroa. Questão apenas de se equilibrar a terminação da obra. Esta cúpula, que é uma sucessão de círculos concêntricos montados uns sobre os outros, também pode ser construída com arcos parciais formando uma ossatura arqueada para suporte de toda a obra. Também é conhecida por abóbada de revolução.

"Abóbada de Arestas" – É uma construção formada pela intersecção de duas abóbadas "cilíndricas" ou "de berço" que se ligam, geralmente cortadas em ângulo recto.

"Abóbada de Barrete de Clérigo" - Esta abóbada, também chamada "de arca de claustro", e a construção inversa da "abóbada de arestas", pois as suas arestas de penetração são reentrantes.

"Abóbada de Cave" - É um tipo de arcada muito em uso antes do emprego do betão armado, que a suplantou. No entanto, ainda algumas vezes se constrói. Como o seu nome indica, a sua aplicação destinava-se a cobrir subterrâneos e era sempre sobrecarregada superiormente de betão magro, logo após o descintramento. São em geral, "arcos de volta perfeita" ou "abatidos". Resistem bem aos impulsos do terreno com larga resistência. Sobre o massame aplicava-se o sobrado do rés-do-chão e os subterrâneos ficavam completamente estáveis.

"Abóbada de Ogiva" - Esta abóbada pode comportar qualquer dos arcos ogivais, que são as suas nervuras, desde os abatidos aos de lanceta. É questão apenas de simples e de bons pés direitos. Nas antigas construções estas abóbadas eram reforçadas exteriormente por arcos aviajados, que tomavam a designação de arcos botantes e descansavam em contrafortes designados botaréus. A denominação "de ogiva" vem dos seus arcos ou nervuras em cantaria, que Ihe dão toda a ossatura construtiva e que são as verdadeiras ogivas. Os espaços entre as nervuras de cantaria são cheios de tijolo.

"Abóbada Anular" - Designação atribuída as "abóbadas de berço" quando cobrem escadas de caracol.

"Abóbada Plana" - É aquela que tem o seu intradorso recto ou plano, convergindo as pedras ou os tijolos a um ponto situado na linha do eixo do arco. Na construção deste tipo de abóbada não é conveniente que as juntas das impostas formem ângulo com mais de 60°.

"Abóbada Esférica de Pendentes" - Esta abóbada, constituída por uma semi-esfera, é apoiada em quatro planas verticais, que são as paredes de uma edificação quadrada, de que resulta a chamada calote esférica, com quatro prolongamentos, que tem a designação de pendentes e se apoiam nos quatro vértices do quadrado.

"Abóbada de Luneta" - São as abóbadas de arestas, em que as flechas não são iguais nas duas partes componentes.

"Abóbada Alentejana" - Abóbada de pequena flecha, construída sem simples, com tijolo rebatido assente ao baixo. Quando só comporta uma fiada de tijolo chama-se abóbada simples, e quando comporta duas fiadas, abóbada forrada.
A primeira fiada de tijolo é assente com gesso de presa e a segunda com argamassa ordinária de cal e areia. As juntas das duas fiadas ficam desencontradas, para melhor travamento de toda a construção.

"Abobadilha" - São as abobadilhas arcos de pequena largura, de comprimento variável e de pequena flecha. Antes do betão armado eram muito usadas para os pavimentos de certas dependências, como cozinhas, casas de banho e outras em que houvesse essa necessidade. Em geral, são construídas entre vigas de ferro I. Outras vezes também eram construídas entre duas paredes. O tijolo usado é o vulgar, maciço ou de dois furos, se não se destina a obra a suportar grandes cargas superiores. O intradorso e quase sempre rebocado, esboçado e estucado ou caiado, e as abas das vigas de ferro pintadas. Sobre o extradorso faz-se o nivelamento com betão magro, a fim de receber o revestimento do pavimento que lhe assenta em cima.

"Abobadilha de Percinas" - Denominação dada "abóbadas de arestas" construídas pelo processo das "abóbadas alentejanas".

"Abobadilha de Engras" - Designação das "abóbadas de barrete de clérigo", construídas também pelo mesmo sistema das "abóbadas alentejanas".»

(Caderno 15, Arcos e Abóbadas, 12)

Citação 2

«CONSTRUÇÃO DAS ABÓBADAS
*A* construção das abóbadas é iniciada pelo assentamento dos simples, tal qual como se pratica com a construção dos arcos.
Os simples das abóbadas pouco diferem dos dos arcos.
Construídas as grades das cambotas, são colocadas à distância de 1m,00 a 1m,50 umas das outras, e sobre elas, estendidos em todo o comprimento, são pregados os coxins, que são umas tábuas ou pranchas cuja espessura maior e menor estará de acordo com a grandeza da abóbada a construir.
Os simples suportarão todo o peso da obra, e para que a massa que se aplica no trabalho se não adira ao coxim, cobre-se este com uma leve camada de areia.
Os simples ou cambotas são, por conseguinte, constituídos pelas grades das cambotas, ou simplesmente cambotas, e pelos coxins. Esta construção deve ser bem feita, de acordo com o arco adoptado, possuir as escoras necessárias para se evitar a deformação no decorrer dos trabalhos, e ser dotada da robustez necessária.
Depois de feito o assentamento do simples, começa a construção propriamente dita da abóbada, assentando as impostas primeiramente, uma de cada a lado, seguem-se as fiadas e, finalmente, atinge-se o respectivo fecho. o melhor tijolo para estas obras é o tijolo maciço e mais ainda o rebatido, e a melhor argamassa é a de cimento e areia, ao traço de 1: 4 ou 1 : 5.
Nos últimos tempos tem sido construídas abóbadas de betão armado, imitando as vetustas obras de tijolo ou cantaria, porém sem justificação o plausível.
Actualmente não há necessidade desse género de trabalho; o betão armado resolve muito bem e vantajosamente a cobertura de grandes espaços, criando tectos planos de que se podem tirar grandes efeitos decorativos.
A construção das abóbadas na actualidade só é justificável na continuação de edifícios antigos, em que é mester manter a sua traça primitiva, mas, nesses casos, não tem lá lugar o betão armado.
No entanto, isso é com os construtores.»

(Caderno 15, Arcos e Abóbadas, 13)

Citação 3

«ESTABILIDADE DAS ABÓBADAS
*A* estabilidade das abóbadas está na sua espessura superior e na espessura e resistência dos pés direitos, que lhe dão o mais forte apoio.
A impulsão das abóbadas e o esforço que exerce sobre os seus pés direitos, não têm o mesmo valor nos diversos tipos e sistemas destas construções.
As abóbadas cilíndricas e as de coroa elevada, como sejam as ogivais, apresentam maior estabilidade e podem suportar grandes cargas sabre o fecho.
A impulsão nestas abóbadas é quase vertical.
Desde a nascença da abóbada até a sua coroa, toda a resistência da obra reside nos rins, parcela, de arco situado entre esses dois pontos culminantes. Às vezes os extradorsos sobre os rins são reforçados na sua espessura.
Em resistência seguem-se as construções de arcos abatidos e elípticos. Nas abóbadas destes tipos a impulsão aumenta à medida que a flecha do arco diminui.
A construção dos pés direitos, dos arcos e abóbadas obedece as leis da estática, como a de contar, mas o estudo dos cálculos de estabilidade é, a bem dizer, muito recente, enquanto que a construção das abóbadas vem de recuados séculos.
A forma de obter a espessura dos pés direitos usada pelos construtores do século XVI, e que tão bons resultados dava, a ponto que ainda hoje as abóbadas construídas então, garantem a mais sólida das resistências, e muito prática.
Consiste esse traçado no seguinte: 
Estabelecida a linha das nascenças de qualquer arco, de volta perfeita, abatido ogival, ou ainda outros, divide-se o próprio arco em três partes iguais e damos-lhe os pontos c e d, alem de a-b da linha recta horizontal, pontos estes que correspondem às nascenças ; seguidamente tiramos uma recta de d para b, que se prolonga para baixo até encontrar um arco de círculo centrado em b e com o raio em d. A intersecção deste arco com a oblíqua d-b dá-nos a verdadeira espessura do pé direito.»

(Caderno 15, Arcos e Abóbadas, 14)

Citação 4

«ABÓBADAS DE CANTARIA
*N*AS abóbadas de cantaria o aparelho das aduelas deve ser muito cuidado e o trabalho da construção, que é o seu assentamento, exige uma certa parícia do construtor e dos seus operários.
Já mesmo o simples deve ser melhor construído e na própria grade da cambota, devem estar marcados todos os espessos das pedras da respectiva convergência, para que, no assentamento, cada uma das aduelas fique no seu lugar próprio, conseguindo-se assim a perfeição do arco.
As juntas entre as aduelas oscilam de 0,008 a 0,012, para que não seja muito delgada a camada de argamassa.
Quando as aduelas são de grandes dimensões, as juntas, entre si, podem chegar a 15 milímetros.
As juntas devem ficar com igual folga desde o intradorso ao extradorso, e a camada de argamassa de ser da mesma espessura em toda a extensão.
Uma abóbada bem construída deve manter entre todas as aduelas as juntas de igual espessura.
Por meio de cérceas bem cortadas marca-se o espesso de cada aduela, e pela marcação do simples regula-se optimamente o assentamento de todas as fiadas.
Depois de feito o assentamento das impostas começa-se o assentamento das aduelas, por fiadas de um e outro lado do arco simultaneamente, para que o simples fique carregado por igual, até se chegar ao fecho da abóbada. Os espessos das pedras devem ficar desencontrados, como é de saber, para o bom travamento da obra.
O simples, estando sempre uniformemente carregado, dá melhor garantia à construção, pois é sabido que a pressão sobre a argamassa das juntas das aduelas é igual em todas elas.
Termina-se a construção da abóbada com o assentamento do fecho, que deve ficar apertado e batido a masso.
Descintra-se após a conclusão do trabalho, dando-se imediatamente o assentamento da abóbada, cujo fecho é de novo batido.
Para a construção destas abóbadas são igualmente próprias as argamassas de cimento e areia, ao traço de 1 : 4 e 1 : 5 ou como melhor convier.»

(Caderno 15, Arcos e Abóbadas, 15)

Citação 5

«DESCINTRAMENTO DAS ABÓBADAS
O descintramento das abóbadas é, como atrás dissemos, feito logo ap6s a conclusão dos trabalhos nas obras de cantaria, e só passado algum tempo, mas ainda com as alvenarias frescas, nas obras de tijolo.
Como nestes trabalhos, e em geral em todas as alvenarias, se dá o *assentamento,* logo não convém que já estejam secos na altura do descintramento, pois que a obra poderia desligar-se parcealmente, caso que se não dá estando ainda as massas relativamente frescas.
O descintramento deve fazer-se cuidadosamente, aliviando-se os simples com as suas escoras a pouco e pouco, para que as ligações não se quebrem, o que aconteceria se o trabalho fosse feito bruscamente. O trabalho de descintar uma abóbada deve durar, pelo menos, meia dúzia de dias, pois que o descintramento das cambotas deve ser muito lento.
Em obras de grande categoria os simples são travados, por meio de parafusos assentes nos prumos de apoio, que depois, vagarosamente, se desapertam, deixando\-os descer subtilmente, nivelada e paralelamente.»

(Caderno 15, Arcos e Abóbadas, 16)

Referência bibliográfica

Costa, F. Pereira da. "Enciclopédia prática da construção civil. Arcos e Abóbadas. Caderno 15". 2.ª Edição do autor. Lisboa: Distribuição da Portugália Editora. (1930-1939) 1955.

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