"Não tinha liberdade nenhuma."- Entrevista a Mariana Bonfim

Item

Tema

Trabalho Doméstico

Título

"Não tinha liberdade nenhuma."- Entrevista a Mariana Bonfim

Entrevistado

Mariana Bonfim (nome fictício)

Resumo

Mariana Bonfim nasceu no ano de 1927 numa aldeia situada perto de Vila Real. A família mendigava para sobreviver. O pai andava de terra em terra à procura de trabalho. Ficou órfã de mãe aos 6 anos. Internaram-na no Asilo de Infância, em Vila Real, onde permaneceu durante 10 anos. Aos 16, a diretora do Asilo arranja-lhe colocação para servir. Passado um ano, é levada para trabalhar em Lisboa, numa casa situada na zona de Santo Amaro. O patrão era engenheiro. Vem ganhar mais 20$00 do que a quantia a que tinha direito em Trás-os-Montes. Faz todo o serviço da casa, acumulando a função de ama. É castigada fisicamente pela patroa pela proximidade afetiva que demonstra ter em relação aos filhos. Cansada de castigos, sai de casa por iniciativa própria e fica ligada a uma família residente na Praça do Saldanha. Ainda frequenta a casa da filha destes patrões, hoje com 90 anos de idade, auxiliando-a nos trabalhos domésticos. O marido de Mariana Bonfim tem problemas de alcoolismo, assim como um dos filhos. Estão alojados numa habitação social, em Lisboa.

Data de nascimento

1927

Data de recolha do testemunho

24 de Outubro de 2009

Local de realização da entrevista

Lisboa (Bairro da Ameixoeira)

Recurso

Transcrição de entrevista por gravação em áudio e fita magnética

Autor da recolha

Inês Brasão

História de vida

Mariana Bonfim: Sou de Trás-os-Montes.

P: E como é que são as suas recordações desse tempo?

Mariana Bonfim: Éramos muito pobres. Tínhamos que andar a pedir. A minha mãe foi sempre muito doente. Quando ela morreu, eu tinha 6 anos. Depois internaram-me no Asilo de Infância em Vila Real.

P: O seu pai trabalhava na terra?

Mariana Bonfim: O meu pai andava de terra em terra porque naquela altura não havia…de maneira que não. (E eram muitos irmãos?) Não, não éramos. Ficaram 3, mas um morreu … mas o meu irmão andava com o meu pai… (e foi à escola antes de ir para o Asilo?) Não. Fui logo diretamente, e foi lá que fiz a 4ª classe. (e onde era esse Asilo?) Era em Vila Real de Trás-os-Montes… (Lembra-se? Foi difícil separar-se do seu pai?) Eh…o meu pai já não estava muito porque ele andava de terra em terra… Eu estava era com uma tia minha mas…custou-me bastante porque…via ir todos…de férias, no Natal e na Páscoa e nas férias nunca ia a lado nenhum porque não me iam lá buscar… (Diz com comoção).

P: Quantos anos lá esteve?

Mariana Bonfim: Estive lá 10 anos. (Era um asilo de freiras?) Não, não era de freiras. Era um asilo de uma senhora, que era de Sabrosa e estava ali a dirigir aquilo. De freiras não era. (davam-vos a escola e podiam brincar, ou eram muito severos?) Um bocadinho, um bocadinho, mas também fez bem em certas coisas. (mas pelo menos fez a 4ª classe). Sim, e na altura a 4ª classe equivale agora ao 9º ano.

P: E depois começou logo a trabalhar?

Mariana Bonfim: Aos 16 anos tínhamos que sair, não podíamos estar lá mais tempo. Fui servir para a casa da senhora que me internou... servir, claro. Estive lá pouco tempo … Depois fui outra vez para Vila Real, mas só estive lá um ano… A senhora morreu-lhe o marido, a vida também não era muito boa…e depois arranjaram-me cá para Lisboa, fui para St. Amaro… …pra lá estive quatro anos, mas também foi horrível…

P: Quantos anos tinha quando chegou a Lisboa?

Mariana Bonfim: Tinha vinte e poucos. Em Vila Real não era para fazer todo o tipo de trabalho, porque tinha uma cozinheira e era para fazer…a limpeza. Depois quando vim cá para Lisboa é que…fazíamos tudo! Era tudo muito diferente. (e tinha direito a um quarto? Como é que a instalaram?) No primeiro sítio não tinha um quarto porque a casa era pequena. Tinham 2 filhos… De maneira que, como eles tinham 2 marquises grandes… o senhor era engenheiro e fez um divã. À noite…abria-se no corredor. De dia, levantava-se e prendia-se…pois… não tinha um quarto.

P: Nessa altura, já ganhava?

Mariana Bonfim: Vim para cá ganhar 50$00. (E em Vila Real?) Em Vila Real ganhava 30! (ri pela primeira vez). E nessa altura sentia que era um bom ordenado? Sim, era. Era (o que é que tinha direito, davam-lhe roupa?) Não, não. Não me davam roupa. Se precisasse tinha de a comprar. Pedia à senhora para me comprar. (mas também já era uma mulher, não é? Ia com a sua patroa comprar?) Ia.

P: Como é que era a relação com a patroa?

Mariana Bonfim: Ela não era má pessoa, mas também levei muitas tareias com ela. (tinha por hábito fazer isso, mesmo com essa idade?) Pois. (Lembra-se o que é que os levava a fazer isso?) Às vezes era porque…ela tinha 2 miúdos…um era mais espertalhão; o outro era mais bebé e então…tinham a mania de…se eu agarrava os miúdos a falar ou a beijar ou isso…não gostavam…e depois eu também refilava, claro. (era quem tomava conta deles?) Pois. Era. (não gostava que lhes desse carinho, era isso?) Não…ficavam sempre, por qualquer coisinha, e depois viam que eu não tinha cá ninguém….

P: E quando eles faziam isso, o que é que fazia? Fugia, ficava no quarto?

Mariana Bonfim: Eh, não fazia nada. Ia ficando. Depois houve uma altura que encontrei uma…uma rapariga que era mais ou menos da minha idade…que era da minha terra….Eu nessa altura fui uns dias para casa dela. E depois de lá arranjei outra casa ali para a Fernão Lopes… (ainda em St. Amaro…lembra-se da profissão dos patrões). O senhor era Engenheiro, era da Carris. (E a senhora não trabalhava?) Não. (e eram os dois a mesma coisa?) Ele quando estava de maré também era mau.

P: A que horas tinha de se levantar, recorda-se?

Mariana Bonfim: Eh, às 7 horas. (E depois, lembra-se se tinha tempo para si? Sentia-se muito cansada?) Não, naquela altura não. (Nunca adoeceu?) Não. (não responde mais). (Fazia todo o serviço?) Pois, aí…foi onde eu aprendi mais coisas, mesmo de cozinha. (E que coisas eram?) Fazia croquetes, faziam rissóis, eram pastéis de bacalhau…fazia-se muita coisa e ela…isso eu não sabia fazer e ela ensinou-me. (E servir à mesa?) Tinha. (Como era?) Tínhamos que andar a servir, em volta, à mesa, com o prato, tínhamos fardas. (Farda com avental?) Pois. (E falava com as pessoas?) Eu não sou muito de falar. (começamos a rir).

P: Já percebi que esses quatro anos não foram muito fáceis, mas, pelo menos, tinha alguma folga?

Mariana Bonfim: Não, eu não tinha folgas porque também não tinha para onde ir. Não conhecia cá ninguém. (então estava em Lisboa, mas não conhecia Lisboa?) Não conhecia Lisboa!... (mas nunca saía à rua?) Não, quando ia à rua íamos à Praça, ou isso, ia sempre a senhora comigo. (não tinha às vezes um passeio?) Não, quando ia às vezes, íamos passear, íamos ao jardim…,mas era com os miúdos…(sorri)

P: Não tinha assim nada de seu, em casa dos patrões?

Mariana Bonfim: Não tinha nada. (Nem fazia croché?) Crochés fazia muitos, a gente fazia muitos crochés para fora.

P: Então quando saiu dessa casa foi porque não conseguia…e não gostava?

Mariana Bonfim: Sim, porque depois, é a tal coisa, também para ser assim tratada, também não…E depois cheguei a ir para a Rua Fernão Lopes, para o Saldanha, para uns senhores que já morreram. Mas ainda vou…ainda vou a uma filha, a uma filha dela que tem 90 anos. 90 Anos, não. Tem agora 99 anos, fez agora em agosto. (ainda vai lá dar um jeitinho?) Vou, e vou também agora para uma sobrinha dela que já tem 82 anos…então dessa casa nunca mais perdeu a ligação. Não porque agora, praticamente, ando nas famílias.

P: E nessa casa, já gostou mais?

Mariana Bonfim: Nessa casa não era mau. (já tinha o seu próprio quarto?) Já, já tínhamos o nosso quarto. (e folgas?) Folgas tínhamos ao Domingo. (e onde é que ia?) Ia ter com uma pessoa que era da minha terra…(risos)… íamos passear. (Do que é que se lembra de Lisboa?) Eu para mim…era só aquele sítio onde estava, não conhecia… (não conversava com outras senhoras que andassem a servir?) Também não tinha muita conversa porque geralmente nunca dava resultados. (E lá também tomava conta das crianças?) Lá não tinha crianças; eram 2 netas, que eram pequenas…e quando iam lá a casa, claro, ainda lhe cheguei a dar o comer à boca e tudo, mas eram muito pequeninas.

P: E como é que olhava para as pessoas daquela casa?

Mariana Bonfim: Ah, era como que seja família. (sentia afeto pelas pessoas?) Pois, o senhor era Comandante da Marinha, também é muito boa pessoa e ele até me abriu uma conta no…no Montepio. Conforme eu recebia, ele levava e depositava o dinheiro. Pronto, eu lá já ganhava 200 contos, 200 contos? 200 escudos! (ri-se) de maneira que… (seria só seu caso ou naquela altura já toda a gente ganhava assim?) Naquela altura já toda a gente ganhava mais ou menos…,Mas isto já vai há…55, 56 anos, 57. Sim, porque o meu filho mais velho já tem 55 anos. Ele nasceu depois de eu sair de lá!... (Fazia todo o serviço?) Fazia tudo. (Deixavam-na conviver à noite, no serão?) Podia (risos) (E sabia o que se passava à sua volta, tinha curiosidade por ler?) Eu ler, nunca fui assim muito amiga de ler.

P: E namoro? Deixavam-na namorar?

Mariana Bonfim: Namorar também não fui muito namoradeira. O primeiro foi o meu marido, foi com quem casei. (os patrões deixavam?) Sim, porque eles até gostavam muito dele. Ele telefonava para lá e gostavam muito de o ouvir. De maneira que o primeiro que namorei foi com quem casei. (os padrinhos foram as pessoas da casa?) Eram para ser, mas como estavam para fora de férias, não foram.

P: Quando casou, deixou de viver nessa casa…

Mariana Bonfim: Pois, mas ia lá trabalhar. E, quando nasciam os meus filhos davam sempre qualquer coisa. E estavam sempre a dar. (já casada e com filhos, manteve-se ligada a essa casa?) Sim. (era muito diferente, para si, estar dentro ou fora daquela casa?) Era diferente porque tinha que lá estar às 9 h e tinha que vir embora para fazer o comer para os meus filhos. (E não gostou de ter assim uma liberdade maior?) Não, porque também não gostava de ter assim muita liberdade. Estive ali 10 anos…metida. Não tinha liberdade nenhuma. Maneira que nunca fui assim muito de… querer mais liberdade (fez-se um silêncio)

P: E quando estava na casa dos patrões, tinha direito à sua intimidade, a descansar no seu quarto às vezes durante o seu tempo?

Mariana Bonfim: Tinha, tinha. Tinha.

P: E a comida?

Mariana Bonfim: Era boa. (era a mesma dos patrões?) Era. Pois. Nunca fizeram comeres separados. (tinha mais alguém a ajudar, ou não?) Não, ia lá a mulher a dias uma vez por semana…A mulher a dias ia lá só para fazer a limpeza e isso, de resto era eu que fazia…

P: E mais, o que é que me quer contar? Houve algum momento mau?

Mariana Bonfim: Foi um bocadinho sempre a melhorar … Nas casas…, mas depois de estar casada também…eu não tive uma vida muito…muito coisa (como a expressar que não melhorou assim tanto), porque ele (o marido) depois desempregou-se, e depois já não havia trabalho…e depois (qual era o emprego dele?) Ele trabalhava numas serrações, a serração fechou…

P: Então no seu caso foi importante continuar a trabalhar, não é?

Mariana Bonfim: Pois, trabalhei sempre…foi…e chegámos, e cheguei a andar a pedir!...(já mesmo casada?) Mesmo casada. Tinha o meu mais velho, e tinha outro que morreu…tinha que andar a pedir porque não tinha para lhe dar…não tinha para o poder sustentar. (não chegava porque era só uma pessoa a ganhar, é isso?) Ah, pois foi. (como é que conseguiram ultrapassar?) Eu trabalhava muito e depois ele também se metia na bebida…

P: Passou a ganhar melhor quando passou a dias?

Mariana Bonfim: Naquela altura ganhava 20$00. Depois tinha aquelas senhas para andar no autocarro, davam-me sempre senhas para o autocarro. (tinha direito a descontos?) Não, nessa altura ainda não havia descontos. (e a saúde, pagavam-lhe?) Eu nunca fui ao médico lá! (é uma senhora muito forte! Deixavam-na levar as crianças para trabalhar?) Levava. Para lá levava, ia para outros lados, tinha que as deixar…, mas, geralmente, iam. Iam por ir, porque, pelo comer, porque o dinheiro que eu ganhava não dava para pagar a quem me ficava com os miúdos. (quando é que a sua vida melhorou um bocadinho?) Eu tenho a impressão que melhorou desde que ele morreu.

P: Os seus patrões ajudaram à educação dos seus filhos? Foram seus amigos?

Mariana Bonfim: Foram. Uma, a D.… até foi madrinha duma que eu tenho, que já tem agora 49 anos. (por isso é que também nunca se separou dessas pessoas?) Pois. A madrinha, a da minha filha, vou lá todas as semanas à quarta-feira…quer dizer, mesmo muito antes de lá andar, ela até me dava mercearia…telefonava-me e dava-me aos 500$00, nessa altura era muito dinheiro…depois deu-me sempre…

P: Hoje já tem alguma idade e continua a trabalhar? Não se sente cansada?

Mariana Bonfim: Eu sinto-me cansada, mas é a tal coisa, a pensão também não dá …e também tenho um filho que nada faz…de maneira que…(então quase todos os dias trabalha?) Pois, só à sexta-feira é que não. E agora à segunda. (quantas horas por dia? O dia inteiro?) Às vezes. Um dia vou para Alvalade, para a tia do M. Terças e quintas é para uma tia do M. também, para Alfornelos…à quarta feira também é uma prima do M. que é a madrinha da minha mais velha.

P: E o que é que sempre gostou mais de fazer?

Mariana Bonfim: Eu naquela altura gostava muito de cozinha. (Ainda gosta de descobrir a fazer coisas novas na cozinha?) Não, agora não. Agora já não tenho coiso para isso. (gostava do serviço da casa?) O serviço da casa não gostava muito, mas tinha que o fazer, claro. (lembra-se da altura em que não havia nada de máquinas…) O fogão era todo amarelo e tínhamos que o ter todo areado. Tinha aqueles tachos amarelos de pendurar na parede, tudo areado, muitas casas eram esfregadas, e depois eram enceradas. (se calhar as pessoas hoje nem sabem o que isso é...) Sim, eu às vezes digo para os meus filhos: vocês falam, falam, falam, mas não sabem o que foi a vida!...Para vocês, até os mais velhos, já foi uma maravilha…Os dois mais velhos é que foram mais sacrificados porque…não tinha. Eu ainda tenho um comigo, já tem 45 anos, também não pára em lado nenhum!

(começa a falar da infância)

Mariana Bonfim: Tinha dias em que tanto eu como o pai, tínhamos lá um quintalinho e tínhamos lá hortelã e fazíamos um chá de hortelã e bebíamos e andávamos assim todo o dia…só andava a pedir, o que arranjava era para dar de comer aos miúdos.

P: Voltou alguma vez à sua terra?

Mariana Bonfim: Não, nunca mais lá fui. Não fui porque ele (o pai) morreu cá, morreu ao pé de mim. E o meu irmão também morreu, de maneira que eu também primos…eu tinha uma tia da parte da minha mãe, também morreu. Tive dois tios também da parte da minha mãe, também morreram, de maneira que não tinha para onde ir lá também, não me orientava lá ir.

P: Quando os senhores iam de férias, levavam-na?

Mariana Bonfim: Não, ficava em casa. Olhe, quando eles faziam as férias, tinham uma filha que também já morreu, que iam para a Rinchoa passar férias com os filhos, e eu ia para lá para a Rinchoa, para o pé deles.

P: Tem boas recordações?

Mariana Bonfim: Ainda cheguei a ir com as filhas para a praia, para Sintra. Mas também ia e tinha que ter a lida da casa.

P: E hoje, quando está no seu cantinho, o que é que gosta de fazer? Gosta de descansar? Gosta de ver televisão? É o que mais a entretém?

Mariana Bonfim: Gosto, pelo menos ajuda… (começa a rir-se). Gosto de ver as novelas (diz com um ar sorridente. (e na sua casa, também tem de tratar dela, não é? Ah pois, aqui é a tal coisa. Se a gente não tratar hoje, trata amanhã, e o trabalho…

P: Quer contar mais alguma coisa?

Mariana Bonfim: Não tenho mais nada para dizer…(ri-se). Deitava-se tarde? Tarde, tarde nunca me deitei. Costumava despachar-me, ia para o meu quarto e deitava-me.

P: Gostava de ir à missa? Tinha essa necessidade?

Mariana Bonfim: Não, olhe, quando estávamos internadas, tínhamos que ir todos os domingos à missa. Agora ali na senhora onde estive no Saldanha, também gostavam, queria que eu fosse…mas uma pessoa ter que…andar…coiso…e acabava por não ir.

P: Em pequena ficou muito traumatizada com o internato?

Mariana Bonfim: É a tal coisa, a gente em pequena é bom porque não tem ninguém, e estamos ali e ao menos ali não nos acontece…nada. Mas também passamos muito porque, se estávamos a gente a ir para a casa de jantar, tínhamos que estar todas de enfiada, em fila, se a gente falava, éramos logo castigadas, ficávamos sem jantar, ficávamos sem almoçar. No verão então, se éramos castigadas ficávamos sem lanche…não foi assim muito…

(Mariana começa espontaneamente a falar-me do regime de trabalho)

Mariana Bonfim: Nessa altura também havia casas que não tratavam a gente como tal, até era a escravidão. Por acaso na última que estive tive sorte porque o senhor era muito boa pessoa, e a senhora também era…e a filha de 99 anos que vivia com os pais também…era mais rebiteza mas pronto, levava-se bem. (essa filha chegou a tornar-se sua amiga?) Ela não…não gostava assim muito de mim porque eu…depois, acabava sempre por refilar porque também estava sempre…

P: Dessas pessoas que viu crescer, ficaram suas amigas? Lembra-se de ter brincado com elas?

Mariana Bonfim: Sim, brincava com elas… Quando elas iam aos avós, ou ficavam lá comigo, é assim. (tinha que as ir buscar à escola?) Tinha sim, aquela que mora em Alvalade, cheguei a ir buscá-la ao liceu. Tinha 12 anos. O M. cheguei a mudar-lhe as fraldas e a levá-lo ao Colégio M., mas também não gostavam muito dele e tiraram-no de lá. Eu sempre gostei muito de crianças.

P: As casas onde esteve eram casas muito ricas?

Mariana Bonfim: Não, não eram. Essa casa da tia do M., a mãe tinha 6 filhos…e o pai era juiz. Por isso é que eu também não ganhava assim… Eles tinham bastantes dificuldades porque os avós é que lhes davam muita coisa. (e nessa casa havia 6 crianças?) Pois. (E recebiam muitas pessoas, com muitos convidados?) ... Quer dizer, o pai recebia pessoas porque ele era juiz da Câmara, pessoas que iam muitas a pagar, iam lá ter com ele, pedir…mas, tirando isso…(a casa era grande?) Não…e essa casa era toda esfregada porque ele ainda tinha a mãe dele e a mãe…e ele também tinha asma, de maneira que não se punha cera, não se punha nada e era tudo esfregado.

P: Por quanto tempo vai continuar a trabalhar?

Mariana Bonfim: Ah… qualquer dia deixo, que uma pessoa já não tem…Agora o pouco que se ganhe sempre vem algum.

P: Ganha ao mês?

Mariana Bonfim: Geralmente todas me pagam ao mês.

P: Tem fotografias de quando era mais nova?

Mariana Bonfim: Não, porque naquela altura não tirava fotografias.

Conjuntos de itens